decisao_emfavor_beneficiario_coibe_aumento_abusivo_plano_saude.

Decisão do TJ-SP, coíbe aumento abusivo em Plano de Saúde de Campinas

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação no 1044952-06.2017.8.26.0114, da Comarca de Campinas, em que é apelante MIGUEL ANTÔNIO PACÍFICO, é apelado UNIMED CAMPINAS COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO. ACORDAM, em 10a Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso. V.
U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores JOÃO CARLOS SALETTI (Presidente sem voto), CESAR CIAMPOLINI E J.B. PAULA LIMA. São Paulo, 6 de fevereiro de 2018. ELCIO TRUJILLO

RELATOR
Assinatura Eletrônica

10a Câmara Seção de Direito Privado

Apelação n° 1044952-06.2017.8.26.0114
Comarca: Campinas
Ação: Plano de Saúde – Revisional e Repetição de Indébito
Apte(s).: Miguel Antônio Pacífico
Apdo(a)(s).: Unimed Campinas Cooperativa de Trabalho Médico

Voto no 32.590

 

PLANO DE SAÚDE – Insurgência do autor contra reajuste anual aplicado em sua mensalidade – Ação julgada improcedente – Reforma necessária – O fato de o plano ser coletivo não autoriza a aplicação de qualquer índice de aumento – Não comprovada de forma idônea a necessidade de elevação da contraprestação no percentual adotado pela ré – Abusividade configurada – Inadmissível a utilização de reajustes aleatórios, destituídos de critérios seguros de apuração – Aumento a ser substituído por aquele autorizado pela ANS no
ano de 2017, mediante devolução dos valores pagos a maior – RECURSO PROVIDO.

 

Trata-se de recurso de apelação interposto contra a sentença de fls. 243/246, de relatório adotado, que julgou a ação improcedente.

Inconformado, apela o autor sustentando, em resumo, que o fato de a ANS não fixar reajustes para contratos coletivos não autoriza imposição de índices desproporcionais; que o aumento aplicado lhe coloca em situação de desvantagem exagerada; que a ré não comprovou a alegada sinistralidade, pois apresentou documento produzido unilateralmente; e que o reajuste deve obedecer aos índices previstos pela ANS (fls. 250/260). Contrarrazões às fls. 270/288.

É o relatório.
O recurso comporta provimento. Consta dos autos que o autor não se conforma com o reajuste anual aplicado em 2017 na mensalidade do seu plano de saúde coletivo, razão pela qual pleiteou o cancelamento da majoração, a observância do índice da ANS, e a devolução dos valores pagos a maior.

O douto magistrado a quo considerou válidos os aumentos aplicados, decretando a improcedência da ação.

Em que pese o respeito por tal entendimento, as peculiaridades dos planos coletivos, cuja fiscalização é menos rigorosa em relação aos planos individuais, não podem servir de apoio para que a ré imponha percentuais aleatórios, destituídos de critérios seguros de apuração.

Ou seja, ainda que a ré não esteja obrigada a observar os índices definidos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, não possui a liberdade de aplicar o percentual que melhor lhe aprouver.

Neste sentido, depreende-se da cláusula 11 do instrumento particular de fls. 48/67 que o reajuste anual ocorrerá com base na
variação dos custos médicos e/ou hospitalares e das despesas administrativas, bem como em função da alteração do nível de sinistralidade.

Deveria a ré, portanto, ter demonstrado quais foram as variações de custos verificadas, e qual foi a sinistralidade apurada, porém não produziu prova idônea a esse respeito. Limitou-se a apresentar o “Parecer de Avaliação de Risco” de fls. 224/228, elaborado por pessoa vinculada à própria ré, a configurar documento produzido unilateralmente; portanto, sem força probante.

Não foram apresentados documentos que demonstrem de forma inequívoca que as despesas superaram as receitas. Desse modo, certo é que não há a menor possibilidade de se identificar a efetiva ocorrência de desequilíbrio contratual que demandasse a aplicação do reajuste anual no índice imposto pela ré em 2017.

Inaceitável a sujeição do consumidor a critérios inseguros de variação de preço, pois tal situação afronta o Código de Defesa do Consumidor e a Lei no 9.656/98, que asseguram o direito de informação e exigem a indicação, com clareza, dos critérios de reajuste e revisão das contraprestações.

Mesmo que assim não fosse, em caso de aumento da sinistralidade, não é do beneficiário o ônus de suportar as consequências, mas da operadora contratada, que detém ou deveria deter conhecimentos suficientes para estimar o valor mínimo necessário para compor
um fundo de reserva destinado a cobrir as despesas médico-hospitalares.
Em virtude da natureza do contrato, destinado a cobrir eventos futuros e incertos, há possibilidade de a ré arrecadar menos ou
mais do que o dispêndio para a cobertura dos eventos. Cabe a ela, no momento da contratação, realizar os cálculos atuariais devidos, considerando situações como a presente e não podendo, posteriormente, invocar o elemento “surpresa”. Não pode a ré atrair diversos beneficiários divulgando mensalidades atrativas, as quais, contudo, não são suficientes para manter uma apólice coletiva, para posteriormente majorar a contraprestação de forma considerável, a pretexto de restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro
do contrato.

Evidente que a medida representa verdadeira alteração unilateral das condições contratuais, em total prejuízo dos consumidores, e sem qualquer ônus para a ré, que acaba se beneficiando por sua própria torpeza.

Além disso, certo é que em 2016 já havia sido aplicado reajuste anual de aproximadamente 55%, não se apresentando crível que
após isso o contrato ainda tenha apresentado desequilíbrio.

Assim, de rigor o reconhecimento da abusividade do percentual aplicado em 2017, bem como a determinação de substituição deste pelo estabelecido pela ANS para os planos individuais.

Além disso, considerando-se que a ré se enriqueceu ilicitamente com a cobrança de valores abusivos, de rigor a devolução dos valores indevidamente pagos a maior.

Desta forma, a sentença deve ser reformada, para que a ação seja julgada procedente, determinando-se: (i) o cancelamento do reajuste anual aplicado em 2017; (ii) a observância do índice divulgado pela ANS em 2017; (iii) a devolução dos valores pagos a maior. Resta invertido o ônus da sucumbência, assim como resta restabelecida, desde já, a antecipação dos efeitos da tutela.

Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso.

ELCIO TRUJILLO
Relator

Compartilhar...Share on FacebookTweet about this on TwitterShare on LinkedIn